É difícil ultrapassar um
pensamento que antecede à nós mesmos. Com certa frequência, nos debatemos na
dor de existir, sem tomar qualquer atitude. O sujeito rende-se ao que lhe
assegura [mesmo que imaginariamente], num trabalho braçal de criar meios de
controle sobre à vida.
Planeja sua morte, onde
repousar seu corpo sem vida e o que deixar para quem fica. O medo não é de
deixar desprotegido os que ficam, mas de não ser lembrado por estes. Quer-se
moldurar-se-a-si-mesmo, para que possa ser sempre lembrado. Mas a vida não pode
ser captada pelas lentes de uma câmera, com a perfeição da psique humana. Retratos podem ser
quebrados, fotos podem ser rasgadas, mas não há nada que possa apagar o que se
inscreveu e se inscreve em nós.
O sujeito é denunciado
pelo inconsciente através dos detalhes, pelas bordas da ação. Entre as palavras
do poema, da poesia, do roteiro de um teatro, de um texto curto ao longo, da
curta ou longa frase dita, do discurso menos elaborado ao erudito. Ele sempre
nos atravessa. Somos inocentes em acreditar que podemos ter algum domínio
sobre nós mesmos. O inconsciente é uma
força que nos governa.
É nitidamente possível se
habituar a viver mal, pela impossibilidade de tomar as rédeas da própria vida.
Mas é possível se reinventar diante desse impossível que é desenhado pelo
inconsciente. A arte em suas infinitas faces, nos apresenta um movimento de
criatividade frente ao acaso e a surpresa da vida.
Mas também existe a
psicanálise, que nos propõe a ideia de movimento, oferecendo um lugar para que
o sujeito trabalhe duro para criar um saber a respeito de si mesmo e, assim,
poder dar cor a sua existência no real e fazer as pazes com esta força
selvagem, pode se haver e se responsabilizar com o que lhe impede de caminhar.
A única maneira de viver
no real é se reinventando atravessado pela fantasia. Na fantasia o sujeito dá cor ao real. É preciso saber o que dói, para que se possa entender
do que se trata e aprender a fazer algo com esse sentimento. É repetindo que se
constrói um saber. É preciso pensar a respeito do que nos causa, para que seja
possível ser criativo e não arriscar a ser iludido por algo que nos petrifica
e nos deixe à mercê do destino.
O sujeito escreve para
compreender o que lhe habita, fala para poder se ouvir e construir meios para
fazer algo novo com o antigo que se repete. Em ambos os tempos criativos
[escrita e fala], faz-se necessário que exista um Outro humano [ignorante das
certas] que possa ler e ouvir. É pelas vias do amor que se faz possível [re]pensar
e [re]organizar o que não funciona em nós mesmos.
O sujeito passa a vida se
concentrando no que funciona, tolerando a desordem que lhe habita. Fracassa-se na
vida na vã tentativa de planejar a proteção uns dos outros e a de si mesmo. O
medo que se cultiva não é do que se perde, mas do que ainda há de se perder
pelo caminho.
Que atravessados pela
arte, literatura e psicanálise não percamos a sensibilidade, a capacidade de se
emocionar e de se permitir ser tocado pelo sofrimento do outro. Na simplicidade se desnuda
qualquer que seja a estrutura intelectual mais sofisticada da palavra. Para se
aproximar do que se pode compreender de natureza selvagem do ser humano, é
necessário que nos desarmemos para desenvolver uma escuta que torne possível
acessar [pelo discurso oculto] a estrutura que o analisante denúncia.
Maicon Vijarva
Psicoterapeuta de Orientação Psicanalítica
Psicoterapeuta de Orientação Psicanalítica
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