27.8.19

#RESENHA - O Pai da Menina Morta

Autor: @tiago_ferro

O livro escreve sobre o que atravessa o nosso cotidiano: a ausência, o tempo, o amor, o ódio, a raiva, a morte, a melancolia que gradativamente ganha corpo depressivo e que faz poesia-drama-comedia-notícia-palavra. O livro me faz lembrar do filme beleza oculta, que soa até um tanto que auto-ajuda, mas está longe de ser, porque falar da vida é falar também da morte, do tempo e sem dúvida do amor. Há amor na morte?

O tempo é uma invenção do amor para saborear e suportar o caloroso e friorento abraço da vida enquanto a morte chega a passos cavalesco de tartaruga. O tempo é como amor, sem conceito que o defina, é sem lugar definido e está sempre onde não se imagina. O amor causa desejo pelo tempo em se fazer existir enquanto a morte não chega para fazer arte.

Às vezes precisamos aprender a ser novamente estranhos para tocar nossa intimidade com a solidão. Tiago mostra numa forma de beleza oculta que a morte não aceita trocados, barganhas, recompensas, ela chega sem avisos, entra sem ser convidada e toma os corpos que pulsão. A morte não ensina como morrer, como a vida, só se aprende com a experiência.

Há um ocultismo belo nas palavras, por sempre mostrar um dito outro em seu avesso. O amor nos faz alcançar o pior de nós mesmos para observar o cometa que racha o céu em nuvens de algodão doce. O amor toca o nada, que mostra a dimensão assustadora da nossa falta que fala de dentro do nosso vazio que tentamos tamponar.

Lutar contra o amor é morrer abraçado em formato de um feto no colo da vida. As lágrimas também fazem palavras. Existem milhares de palavras numa lágrima. O pai da menina morta é a chance de dizer que é importante que possamos dar forma a nossa dor e sofrimento através das palavras, sempre inundadas de nós, deixando o sangue em cada letra que se escreve, fala.

Que possamos transformar o que dói em palavras, arte!

Obrigado @tiago__ferro por sua escrita, e @todavialivros por acreditar na expansão dessa obra espetacular.

23.8.19

sei lá, talvez seja nada disso

A vida é ramela nos olhos. Ainda ontem te vi sorrindo no ônibus, alguns minutos do desembarque no terminal. Foi quase que um sentimento terminal que me abraçou as pernas. Ou foi o coração, que me quebrou as pernas? Você tem o místico de me deixar sem oxigênio nos pulmões por dois longos minutos. Quase uma vida inteira.

Amor é teorema que nunca se completa, ele fica ali repousado em busca de uma nova face para se reinventar. Sei, eu tô avisado de que não mais existirá a junção da nossa singularidade: o laço da nossa pluralidade. Nossas vidas estão tão baralhadas de futuro, passado e presente que não sei qual via me desvia de você. Sempre tropeço em você em nome do amor.

Não vou negar, tenho apreciado a falta que tu me faz. Talvez essa falta me faz percebe que precisava de ficar mais íntimo comigo mesmo. Estive tempo demais com você. Quiçá possa ser uma questão. O que me atropela a vida é alcançar o saber que esse texto fala mais da degradação de uma intimidade com o Outro, que como garoto mimado desamparou.

Um Outro que é familiar, embora tenha a forma de um estranho que encarna em meio ao corpo e a alma produzindo uma linguagem que me faz falar de você para refletir mais sobre mim. O amor é travesti, é inconsciente sem sexo, sem corpo, sem gênero e faz da gente turbilhão.

Eu sei lá, pode ser que não seja nada disso, talvez seja tudo loucura. Pode ser que seja só um delírio Sei lá, gosto de brincar com as palavras!

17.8.19

fazer análise é reconhecer e criar

Perder o passo acelerado, espreguiçar os tecidos rígidos na análise é coragem para aprender a caminhar, coragem que amarrota o pano firme do corpo, que abrem portas para que os furos sempre existentes, antes tamponados, assumam sua forma original fazendo ato: criação.

O processo de transferência em análise desfarela as certezas, convoca o sujeito a borrar, a desconfigurar para fazer coisa outra com o que fica, resta e assume formas novas. A psicanálise é a peste que convoca a sexualidade, a política e, mais ainda, a palavra ao discurso. Mas palavra é pecado, quando liberta dos semblantes do pai comum ao pai divino.

Se a psicanálise convoca a palavra, convoca também as figuras demoníacas do inconsciente do sujeito: o desconhecido familiar. Na tentativa de se justificar em análise, o inconsciente brinca, faz atos falhos e repetições com palavras e enredos quase que despercebidamente.

A análise é mais que falar de si mesmo, é falar de um outro que nos faz sentir a nós mesmos. Quase sempre sendo esse outro a sombra das dores e sofrimento que não cessa de criar palavras, quando não mais existe sinônimos.

É na análise que se aprende as praticidades da vida, a organizar os espaços, a fazer novos laços e reparar antigos. Fazer análise é aprender a criar palavras, coisas e a vida, é também se reconhecer em tudo isso inconsciente.

Porque análise é vida
Vida é amor
Amor é humano
Humano é falha
Falha é vida.