24.7.20

A NOCIVIDADE DO "QUERER AJUDAR"


Essa é uma pergunta importante, que se impõe no início de uma entrevista de demanda de análise. Ao levarmos ao pé da letra essa questão, novas perguntas nascem. E fica muito claro que “querer ajudar” no processo de análise é totalmente nocivo para quem procura uma análise. O analista deve estabelecer princípios básicos: o ambiente com suas características, quais critérios utilizar para aceitar ou não uma demanda de análise. Tais princípios vão orientar sua prática, oferecendo segurança para que possa desenvolver seu trabalho clínico.  


Quando o analista não está em dia com o tripé psicanalítico: análise pessoal, grupo de estudos e supervisão, cederá a demanda do analisante de “querer ser ajudado”, que ao invés de contribuir com uma mudança catastrófica eficiente, irá causar ainda mais estragos na vida de quem deseja desesperadamente salvar-se de si mesmo. 


E nos casos de crianças? Os pais é que são o pano de fundo responsável. Pais que não querem largar o osso dos hábitos arcaicos para lidar com a mudança que uma análise exige, de imediato podarão qualquer efeito analítico que possa ocorrer na criança. Por isso é importante que o analista que inclua na sua clínica a psicanálise com crianças, esteja avisado que numa análise com criança os pais tem seu lugar significativo e sem eles orientados, podem amarrar ou podar uma análise por  inveja em desejar estar no lugar das crianças e sentir seus efeitos. 


O analista deve sempre se calar e esperar quando o sujeito ainda não está disposto a largar do osso de seus hábitos cômodos, para se responsabilizar por sua análise: estar disposto ao trabalho analítico de ser acolhido pelo ambiente e, assim, maduro para a escuta de si mesmo e da palavra do analista. 


Sem levar em conta esses questionamentos, um analista apenas irá promover uma mudança catastrófica doentia por desejar posicionar o analisante sob a conduta de sua ética que não terá nenhum efeito a não ser se contaminar com a insatisfação apresentada pelo analisante para toda sua clínica, desmerecendo todo seu trabalho desenvolvido durante sua vida. 

 

Maicon Vijarva
@acuradefreud 

23.7.20

ÀS VEZES AVANÇAR É SOLTAR AS RÉDEAS E SE DEIXAR ULTRAPASSAR

@marcosquinoza
A página em branco do começo de uma análise é, de modo geral, uma ideia que, embora assustadora, pareça ser um ato corajoso para um sujeito que inicialmente traz como escudo de proteção o slogan de querer se autoconhecer. Essa ideia logo vai se dissolve com o passar das sessões e o sujeito começa a perceber que sua busca por uma análise é de outra ordem, que toca o impossível de ser dito em palavras, e por faltar vocabulário ele busca inventar para tentar dizer o que o estrutura e, talvez, nesse processo descobrir fragmentos sobre si mesmo. 

O sentimento de dor e ruína nos atravessa e convoca ao movimento implicativo de promover uma mudança catastrófica urgente e necessária para continuar a existir. A análise funciona como uma espiral gradativa, entrar de cabeça nesse processo nos faz acessar do pouco ao muito, do raso ao profundo – de forma desmedida – a própria loucura, o trágico, a vida. 

Tal ritual de brincar de inventar palavras para contar de si mesmo promove uma queda das ideias pré-estabelecidas, que conduz o sujeito a observar a fragilidade da vida; nessa mudança de vértice faz o sujeito no mínimo a buscar a restabelecer condições mínimas necessárias para o cuidado e cultivo com a vida, para suportar suas adversidades. 

Na análise o sujeito é provocado por seu próprio discurso a produzir questões ao invés de respostas, a trabalhar com aquilo que Nietzsche se interesse e que Viviane Mosé traz no seu livro (1): a natureza que traz em seu próprio corpo e que o constitui. Percorrendo a própria história de vida procurando o que está escondido por trás da cultura familiar e os valores que reproduzimos ser percebermos essa repetição. 

Talvez uma análise seja uma busca difícil, por nos levar a nos esbarrar com o vazio, a falta, o desamparo, a insignificância, os restos de experiências que tatuaram em nós algo que necessita de colo, acolhimento, cuidado e nutrição. O sentimento oceânico que necessita de suas quedas nas praias de uma escuta do outro, para que o sujeito possa aprender a escutar o que ressoa para além de suas palavras. Não é fácil trabalhar com os sentimentos, tanto Freud quanto Bion deixam isso bem claro a partir de seus escritos. 

Tal manifestação me faz recordar de uma citação de Freud de um dramaturgo em O Mal-estar na Cultura (2): “Não podemos cair para fora deste mundo”. Um sentimento de ligação indissolúvel e um pertencimento à totalidade do mundo exterior. Não dá para deixar de sermos quem somos, podemos nos iludir até o pescoço e adiar pensar o que nos estrutura, o que sempre nos leva a pagar no final um alto preço. 

Ao caminhar numa análise é possível aprender a falar de si mesmo, a se esbarrar com o inconsciente e seus efeitos que atravessa tudo que fazemos conosco e com o outro. Isso que se escreve numa análise nos faz recordar, repetir e elaborar através de uma reescrita, em que se inicia o processo criativo de inventar a si mesmo. 

Maria Homem traz isso bem implicativo em sua obra (3), que a arte, o processo criativo, a música, a filosofia, a psicanálise não nos salvam do trágico, da loucura, da vida e de si mesmo. A análise nos provoca a sentar do lado do inquietante e suportar seus efeitos no limiar do silêncio. Falar é também fazer pausas. Quando falamos transitamos por direções avessas ao que horizontalmente éramos capazes de perceber no início do ingresso em uma análise. Às vezes o que nos faz avançar numa análise é soltar as rédeas e se deixar ultrapassar pelo que tentamos escrever ao falar. 

Tenho aprendido muito com alguns escritos de Wilfred R. Bion (4) e a minha experiência na clínica; um desses aprendizados é que numa análise o mais importante é o ambiente acolhedor, em que se aprende como lá em Winnicott, a gestar os pensamentos, a si mesmo e o outro. Suportar a si mesmo na presença do outro pelas pausas cheias de um silêncio que implica a se acolher na aparição do vazio sempre desconhecido. 

Maicon Vijarva ⠀ 
@acuradefreud 

Referências 

(1) Mosé, Viviane. A Civilização se olha no espelho. Nietzsche Hoje: sobre os desafios da vida contemporânea. Vozes, 2018. @editoravozes 
(2) Freud, S. (1930). O Mal-estar na cultura. Editora Autêntica. 2020. @autenticaeditora⠀ 
(3) Homem, Maria Lucia (1969). No limiar do silêncio e da letra: traços da autoria em Clarice Lispector. Boitempo: Edusp, 2012. @boitempo 
(4) Bion, Wilfred R. Seminários Italianos. Blucher, 2017. 
(5) Winnicott, Donalt W. (1896-1971) Bebês e suas mães. Ubu Editora, 2020. @ubueditora

22.7.20

A ANGÚSTIA E SUAS POSSIBILIDADES DE CRIAÇÃO EM NOSSO TEMPO


Palestra realizada no MINI CURSO DE FÉRIAS do Grupo de Estudos Psicanálise do Acolhimento - GEPA, que aconteceu no dia 27/07/2019. 

Grupo de estudos psicanalítico online: 

“O Lugar dos Pais na Psicanálise com Crianças” 
Sábados, 15h00 às 16h30 (mensal) Via Skype [horário de Brasília] 
Mais informações pelo whatsapp : (17) 98151-6943