EM
ANÁLISE NÃO SE PROPÕE MUITOS ADEREÇOS À CRIANÇA, o ideal é aguardar as suas
projeções frente ao analista. Quando esta fantasia transcorre no real,
possibilita que a análise ocorra de forma evolutiva. O que recorda um de meus
textos, onde reflito que a análise só sobrevém a partir das possibilidades do
paciente em manifestar suas queixas de forma figurada, usando atributos de
linguagem em que se mistura o verbal com o não verbal no set-terapêutico. A espontaneidade
à luz da Psicanálise.
O
analisando a partir desta sintonia entre a fantasia e o real, consegue
transcrever para realidade os seus sentimentos ocultos – inconsciente –, mas de
forma muito sintética. Chamamos esse período de sedimentado, pois traz
informações rasas, no entanto importantes para o sujeito, para que se sinta seguro de si mesmo, e então aparecer para o analista, evidenciando de forma degrade o seu eu ideal – o
que ele é –, trazendo à tona seus sentimentos incubados.
Neste
texto refletiremos juntos alguns ensaios sobre os contos de fadas a partir dos
estudos do aparato da Psicanálise, no qual trazem contribuição para compreensão
do desenvolvimento da estruturação do Ego, id e superego, desde os primórdios da
infância até a vida adulta. Os ensaios aqui narrados nada mais são do que uma
forma de pensar as complexidades da mente humana frente aos enfrentamentos e
habilidades adquiridas pelo sujeito devido às necessidades do mundo externo,
com a intensão de suprir as lacunas do mundo interno.
As
observações da psicanálise ao decorrer dos anos pós-freudiana, na qual podemos
evidenciar de Psicanálise psicodinâmica, mediante muitas contribuições
enriquecedoras que ocorreram, ensinam-nos que, mesmo nos seus mais tenros anos,
as crianças experimentam não apenas impulsos sexuais e compulsivas crises de ansiedade
(será que podemos dar essa nomenclatura?), como também grandes desapontamentos:
questionamentos sobre si mesma e o mundo.
Em
concordância com Freud, História de uma neurose infantil [“O homem dos lobos”]
– (1917-1920):
A
análise que realizamos na própria criança (...) parecerá em princípio mais
confiável, mas não pode ser muito rica de conteúdo; é preciso emprestar à
criança muitas palavras e pensamentos, e mesmo assim as camadas mais profundas
serão talvez impenetráveis para a consciência. (pág. 16)
O
autor propõe refletirmos, que para a criança é mais fácil se utilizar de ferramentas numa linguagem de fantasia, para descrever seus conflitos
internos, no qual não consegue sintetizar verbalmente de forma clara para o
adulto. Assim emprega personagens muitas vezes dos contos de fadas, para
expor no mundo externo essa dualidade de sentimentos que ela mesma não
compreende perfeitamente.
Na
contemporaneidade, bem como no passado, a tarefa mais ideal e também mais complexa
para os pais – cuidadores – na criação de uma criança é ajudá-la a encontrar
significados na vida. Muitas experiências de evolução são necessárias para que a criança chegue ao nível de maduração, na busca de seus significados no mundo: interno ou
externo. Essa busca e experiência devem ser acompanhadas junto aos pais – cuidadores.
Bruno Bettelheim autor do livro "A Psicanálise dos Contos de
Fadas", 2011, nos leva a refletir o imaginário dos contos
de fadas no quotidiano, escreve que:
A
criança, à medida que se desenvolve, deve aprender passo a passo a se entender melhor;
com isso, torna-se mais capaz de entender os outros e, eventualmente, pode se
relacionar com eles de forma mutuamente satisfatória e significativa. (pág. 10)
Segundo
o autor, as experiências acompanhadas pelos seus educadores – pais e/ou
cuidadores –, devem ser o primordial para sua adequação no mundo interno e
posteriormente no externo. No processo de aprendizagem/experiência, a
compreensão da criança na cisão a respeito do bem e do mal será de grande valia,
visto que caso ela não compreenda essas duas potencialidades que são parte de
si, poderá buscar de forma psicótica e/ou neurótica, em instituições que irão
perturbar ainda mais seu aparelho psíquico.
A
partir desta perspectiva, os contos de fadas são para criança histórias muitas
vezes de teor dramático que, por sua vez, contribuem para que a criança, de
alguma forma, possa imaginar-se como o personagem que esteja, no conto,
vivenciando aspectos muito próximos à sua vivencia. Como podemos ver, quando a
criança elege um personagem que a represente no conto – ocorre a identificação –,
o que era imaginação passa para o processo de simbolização no real e, assim,
cria-se um vínculo entre a criança – indivíduo real – e o personagem do conto imaginário.
De
acordo com Bruno Bettelheim, ainda em seu livro A psicanálise dos contos de
fadas, discorre:
Para
não ficar à mercê dos acasos da vida, devemos desenvolver nossos recursos
íntimos, de modo a que nossas emoções, imaginação e intelecto se ajudem e se
enriqueçam mutuamente. (pág. 10)
Bem
sabemos que, diferente das crianças, os adultos de alguma maneira conseguem
expressar seus sentimentos dolorosos – internos – a alguém ou canalizá-los em
algo, através do afeto, ou agressividade, que para criança seria muito árduo,
sem algum efeito saudável para seu psíquico, por não ter elementos suficientes
para lidar com a frustração.
Ou seja,
para criança esse processo ocorre com certa dificuldade, por ainda estar
adquirindo referências para a estruturação do seu eu ideal (Eu – Ego), ela
então não consegue encontrar significados, para expressar através da linguagem
verbal – fala; ou em atitudes que exijam clareza e, assim, evidenciar sua
insatisfação com si mesma e com o Outro, externo.
A
criança encontra esse tipo de significado nos contos de fadas. Como muitas
outras percepções psicológicas modernas, esta foi antecipada pelos poetas. O poeta
alemão Schiller escreveu:
Há
um significado mais profundo nos contos de fadas que me contaram na infância do
que na verdade que a vida ensina. (pág.12, Bettelheim)
Em “Ensaios
sobre teoria das posições”, texto publicado neste blog em junho 02, 2012. Melanie Klein nos propõe
pensar sobre:
Os processos primários e secundários da psique existem desde o início
da vida do bebê, ou seja, desde o útero. Existe, também, sensata tendência à
integração, dizemos que – Eros é o influenciador neste aspecto, e Thânatos é o
mestre em influenciar a desintegração. O bebê em sua imaturidade não pode
distinguir tal diferença entre ambos dentro do processo psíquico do humano.
A
autora propõe um inconsciente primitivo do bebê, (aqui refletido sob a visão em
torno da criança) representado por objetos parciais e descrevendo-o como a
posição esquizo-paranóide, de tal
maneira que, na satisfação às frustrações, o bebê integrar-se-ia a estas partes
em um objeto total, vivenciado o que Klein nomeou de posição depressiva. A posição esquizo-paranóide
tem início do nascimento até por volta dos seis meses de idade, o
desenvolvimento do Eu é determinado pelos processos de introjeção e projeção.
Entendemos
que, a primeira relação objetal do bebê ocorre com o que Klein chamou de seio
bom e mau. Ou seja, o conto de fadas já começa a ser evidenciado na vida do
sujeito logo nos primeiros contatos com o mundo interno e externo, este que
ainda se faz extremamente ligado com o corpo da mãe, bebê-mãe são mesma pessoa.
Mantendo esta linha de pensamento, é possível notar que os impulsos destrutivos
e a angústia persecutória encontram-se no seu clímax, igualmente como os
processos de divisão, onipotência, idealização, negação e controle dos objetos
internos e externos.
O
que proponho é de pensarmos sobre Mãe-Bebê, quanto ao conceito de Eros e
Thânatos. A mãe é uma grande fonte de estudo, nas contribuições tanto de Eros
quanto de Thânatos no processo de desenvolvimento do Bebê, em sua contribuição de
integração – Eros –, e desintegração – Thânatos.
Bem como sabemos,
segundo Wilfred R. Bion (1897 – 1979): a mãe é o continente que oferecerá forma
àquilo que é o bebê, que chamaremos de conteúdo.
No desenvolvimento, é proposta uma constância, já que o bebê está todo desordenado, é a mãe que apresentará o norte à vida do bebê, ensinado a hora de mamar, brincar e dormir. Havendo ausência desse aconchego, e atenção da mãe na tenra infância, a criança, consequentemente, terá algumas dificuldades em lidar com esta falta na fase adulta.
Ao
pensarmos sobre toda essa reflexão, é manifesto que os contos de fadas são tão
necessários para criança em seu processo de descobrimento de si mesma e do
mundo, por ir além da imaginação, podem assim, a partir do simbolismo do
personagem, àquele no qual ela elege para representá-la, possa de alguma
maneira ajudá-la a lidar com seus conflitos internos e externos. Lembrando que,
o auxílio dos pais – cuidadores são de extrema importância no desenvolvimento
dessa capacidade de simbolização e elaboração de experiências.
Em
suma, deixo a última reflexão de Bettelheim:
Nossos
sentimentos positivos nos dão força para desenvolver nossa racionalidade; só a
esperança no futuro pode sustentar-nos nas adversidades com que inevitavelmente
nos deparamos. (pág. 10)
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
FREUD,
SIGMUND, 1856-1939. História de uma
neurose infantil [“O homem dos lobos”]: além do principio do prazer e outros
textos (1917-1920) / Sigmund Freud; tradutor e notas Paulo César de Souza –
São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
BETTELHEIM,
BRUNO, 1903-1990. A psicanálise dos
contos de fadas / BRUNO BETTELHEIM; tradução de Arlene Caetano – São Paulo:
Paz e Terra, 2007. 21ª edição revista.
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