2.5.15

AFETIVIDADE E RECONHECIMENTO: UM REMÉDIO PARA O PESSIMISTA

“Tu te queixas porque não encontras nada a teu gosto? Então, são sempre teus velhos caprichos? Ouço-te praguejar, gritar, escarrar – perco a paciência, meu coração se despedaça. Ouve, meu amigo, decide-te livremente, a engolir um pequeno sapo gordo, depressa e sem sequer olhar para ele! – É remédio soberano contra a dispepsia.”
Nietzsche – A Gaia Ciência, pág. 27.



Em nossa trajetória de vida, somos ensinados que devemos lutar a todo custo, não importando quais ferramentas são utilizadas, para alcançar nossas metas – ou as metas de nossos pais ou pessoas que idealizamos. Não é raro, que sempre somos manipulados, por parentes, amigos social, amigo de profissão e entre outros, a inclinarmos nossa energia aos pensamentos deles.

Quando crianças há o sentimento indigesto de inveja, quando o trabalhinho do amiguinho saiu melhor que o nosso... já nos sentimos incapaz de criar, pois remoemos por algumas horas o desapontamento que o fracasso inspira em nosso interior. Mas, quando somos nutridos pelo mesmo professor, que todos podem alcançar o seu mérito, sem cópias, ficamos empolgados e voltamos a criar, trazendo o eu interno para o externo, tendo como resultado, um brilhante trabalho. O sentimento de inveja é normal na infância, mas quando não trabalhado por um adulto junto com a criança, pode levar a adultos pessimistas.

O escritor e psicoterapeuta Stephen Grosz, relata em seu livro, um trecho brilhante:

Não elogio uma criança pequena por fazer o que ela deveria ser capaz de fazer. Eu elogio quando faz algo realmente difícil – como compartilhar um brinquedo ou demonstrar paciência.  Uma vez observei Charlotte com um menino de quatro anos que estava desenhando. Quando ele parou e levantou os olhos para ela – talvez esperando um elogio –, ela sorriu e disse: “Há muito azul no seu desenho.” Ele respondeu: “É o lago perto da casa da minha avó – há uma ponte.” Ele pegou creiom marrom e disse: “Vou lhe mostrar.” Sem pressa, ela conversava com a criança, mas, o que era mais importante, ela observava, ouvia. Estava presente.

O que o autor observou, bem como eu, é que a criança não deve ser elogiada por qualquer coisa que ela faz ou a todo o momento, pois isso além de causar impacto a outras crianças, pode também causar um desastre no interior da própria criança, impossibilitando o universo criativo, ou seja, de continuar explorando as possibilidades de experimentar, ousar.

É importante incentivar nossas crianças, jovens e até mesmo adultos. Mas é preciso ter um discernimento e bom senso, para ser uma base sólida para quem procura identificação, como a criança. Não devemos descartar, no exemplo de Charlotte, que o reconhecimento é extremamente importante, mas em momentos que apresente dificuldade, como expressar paciência e compartilhar algo individual.  Talvez esses sejam gestos, para solidificarmos uma sociedade melhor, mais humana e menos individualista.

Outro pensador, que ensina e muito sobre afetividade, reconhecimento e otimismo é Mário Sérgio Cortella, pensador filosófico contemporâneo. Uma frase que me marca até hoje:

Nós não nascemos prontos e vamos nos fazendo, nós nascemos não prontos e vamos nos fazendo.

A criança precisa aprender, que não nasceu pronta, e por isso é necessário se esforçar para explorar suas habilidades, atualizando suas habilidades e conhecimentos. Por isso, que é necessário ser otimistas, acreditar que as coisas podem mudar, as pessoas podem mudar e o mundo pode sim ser melhor, basta nutrirmos isso em nós e no outro. No livro de Augusto Cury – O Futuro da Humanidade, ele relata que a esperança é essencial para vida humana, visto que sem ela, não iríamos chegar a lugar nenhum, por mais que isso pareça em primeiro momento utópico.  É importante existir esperança e otimismo em nossos corações e mente, só assim iremos caminhar para evolução de nossa espécie.

O pensador e poeta contemporâneo Sérgio Vaz, em seu livro Leitura, pão e poesia. Descreve:

“Revolucionário é todo aquele que quer mudar o mundo e tem coragem de começar por si mesmo.”

Na perspectiva do poeta, não há como mudar nada nem ninguém, se nossos planos e objetivos não vierem de dentro, do nosso interior. Assim, podemos cogitar que só é possível ensinar, quando estamos prontos a aprender com nós mesmos e com o outro, visto que, não é possível ensinar sem afetividade, reconhecimento e otimismo.

Quando pensei em escrever este texto, não cogitei como começar, nem como finalizá-lo. Deixei fluir, talvez não tenha começo, meio e fim. Mas, tentei ser o mais fiel aos meus pensamentos. E me recordo neste exato momento, que em minha experiência na fundação casa, um projeto enriquecedor, que vale a pena ser conhecido por você que agora lê este texto. Nas fundações (cadeia para delinquentes, como cogitado pela sociedade) os arte-educadores, são a base para a reconstrução da cidadania dos nossos jovens, dando autonomia e nutrindo-os, na visão de um mundo possível para eles, fora e longe do crime.

Longe da ideia primitiva de redução da maioridade penal, os arte-educadores acreditam em nossos jovem em medidas prisionais, pois se não for acreditar é melhor nem entrar no universo da fundação casa, pois de crítica já basta a sociedade. Por isso, devo citar aqui também um brilhante poeta otimista, Renan Inquérito, em seu livro Poucas Palavras, ensina-nos:

Não quero é ter que aceitar
Não quero é ter que engolir
Que uns nasceu pra brilhar
E outros nasceu pra polir

A afetividade e o reconhecimento moderados e sensatos, serão a base para uma construção sólida e sadia para elos, entre os seres humanos e humanizados. Esperança é uma pílula que devemos carregar junto com a gente, nunca deixando de tomá-la, quando sentirmos ofuscados pela realidade dolorosa. 

"Se você quer ir rápido, vá sozinho. Se quiser ir longe, vá acompanhado" 
 Provérbio africano